Das coisas que são e das que não são

15:08 by Bruno Godinho


As “coisas que são” e as “coisas que não são” se parecem muito. Mas muito mesmo. Às vezes a gente até confunde qual que é qual. Pra ser bem sincero, vejo pouca diferença entre elas. A principal é que as “coisas que são”, existem. As “que não são”, bem... não.
                Como isso é bastante confuso, recorro ao filósofo que sempre dizia que “uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa”. Entendeu? É, é difícil mesmo compreender. Vou tentar exemplificar: quando eu era criança eu tinha um amigo imaginário. Ele era azul. Já não me lembro o nome, mas que era azul, era. A gente brincava o dia todo. Era muito legal. E ele existia pra mim. Ele falava comigo. Ele tava junto nos momentos bons e nos ruins. Era meu amigão. Um dia me falaram que ele não existia. Logo briguei: “Ele é meu! Saí daqui seu invejoso”. Passou o tempo e percebi que só eu o via. Só eu o escutava. Só eu achava que ele era. Na verdade, ele não era. Ele nunca foi. Ele pertencia às “coisas que não são”. Mesmo eu achando o contrário. Que pena! Eu estava enganado. Depositei muita atenção a ele e hoje ele nem é azul, nem branco, nem cor de burro fugido. Ele faz parte das “coisas que não são”.
                Desde aquele dia, tenho me esforçado para colocar tudo em seu devido lugar. As “coisas que são” de um lado, as “coisas que não são” de outro. Deixo tudo arrumadinho para evitar decepções, mas nem sempre consigo. Criei até um jeito próprio pra categorizar isso. Por exemplo, as “coisas que são” a gente pega, apalpa, mostra na foto, joga pra cima. As “coisas que não são”, bem... não.
                Não pense que foi fácil assim distinguir uma da outra. Foram anos de tentativa e erro. Mais errando que acertando, mas sempre tentando. Nesse tempo, aprendi que “as coisas que são” ocorrem naturalmente. Deu um jeito leve, com fluidez. Quando você menos percebe, elas já são e pronto. Agora, “as coisas que não são” são mais difíceis. A gente tem que insistir muito para que elas aconteçam. Aí forçamos a barra para ver o que é invisível. De fato acreditamos nelas, mas o tempo nos mostra a verdade. Ele sempre mostra. Algumas coisas não são. Por mais que tentemos, elas simplesmente não existem.
                Acredito ainda que o que é verdadeiro chega até a gente. Como num imã na geladeira. Já o que não é, é repelido, afastado. Pode fazer força para se aproximar, mas está sempre longe. Sabe o porquê? Porque essa coisa simplesmente não existe. A gente quer que exista, mas é pura ilusão. São “coisas que não são”.

                Já estou velho, barbado, com cabelos brancos e jeito ranzinza. Ainda tenho saudades do meu amigo imaginário. Sei lá, força do hábito. Nunca o esqueci de verdade. Vai ver, quem sabe ele que pertence às “coisas que são” e eu, bem... não.

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