A oração de um lobo

10:42 by Bruno Godinho

Reverberou por toda a planície um uivo desesperado. Triste. Melancólico. Era uma tarde fria e cinza. Após três luas, o grande dia havia chegado.

O uivo circulou por todo o vale e pela mata fechada ressoou. Com ele, o medo e a aflição. Todos já estavam preparados, mas o uivo... ah, o uivo... adentrava as entranhas, balançava a espinha, tremia até o mais contraído músculo, dilatava as pupilas e chegava até aos pelos, arrepiando todos.

Na planície, a alcateia já se alvoroçou ao sentir o cheiro vindo da floresta. Suas papilas olfativas sentiam ao longe o necrófago odor do ódio, o fétido cheiro da morte e também o ácido aroma do medo. Com certeza, a matilha selvagem da mata se aproximava velozmente e ferozmente.

A noite então caiu, e ao céu escuro resplandeceu a lua. Não era a Nova, repleta de esperança. Nem a Minguante, contemplativa. Muito menos a Crescente, inspiradora. Subia aos céus a lua Cheia. Cheia de medo, pavor e insegurança. Todos aguardavam por ela. Ao atingir o ponto mais alto do céu, a luta iria começar.

De um lado, a matilha raivosa vinda da floresta. Do outro, a alcateia voraz da planície. Entre eles, um gigante corpo celestial e muitos, muitos uivos. Foi então que um jovem da planície se aproximou ao seu líder e questionou: “Por que uivamos? Seria para pedir forças para o combate ou para intimidar os inimigos?” Mesmo com a raiva pingando pela boca, o chefe respondeu: “O uivo é uma oração para a lua. Uivamos não para derrotar nossos inimigos na guerra, mas sim para que não haja mais motivos para guerrear”.

E foi então que, com a lua a pino, este lobo uivou o mais alto que pode.
Depois desse dia, seu uivo nunca mais fora ouvido.



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