Volta, lambada

17:28 by Bruno Godinho

Não faz muito tempo, mas dizem as más línguas (nunca as boas) que era comum ver em forma de adesivos ou pichações a frase “Saudades do Figueiredo e da gonorréia” numa evidente crítica ao governo pós-ditatorial e à proliferação maciça da AIDS.
 João Figueiredo, militar, 30º Presidente do Brasil


Que a ditadura militar torturou a democracia, calou a liberdade de expressão, matou o bom senso e desapareceu com nossa dignidade todo mundo sabe. O que nem todos reconhecem são os pontos positivos dessa autoflagelação social.

Motivados pela censura, jovens caetanos, gils, chicos, tons, mutantes, novos e velhos baianos se desdobravam para emplacar hits que tivessem mais que a aceitação popular. Precisavam do aval do DCDP - Divisão da Censura de Diversões Públicas. Astutos e incansáveis, esses artistas dedilhavam prosopopéias, ritmavam metáforas e solavam trocadilhos que este autor jamais será capaz de escrever. Um tempo de conteúdo farto e rimas ricas. Bons tempos.

 Capa do álbum de Tom Zé, que em plena ditadura retratou o close de um ânus com uma bola de gude.

Sei que novas canções à altura daquelas dificilmente vão adentrar nossos WalkmanPods e que provavelmente outros hinos da música popular brasileira provavelmente não serão mais compostos. São outros tempos, outros ouvidos. Vão os anéis, ficam os dedos.

Sei também que seria muita pretensão da minha parte sentir saudades da ditadura, da gonorréia ou mesmo da Amélia - coisas que nunca tive, situações que nunca vivi.  E que não adiantaria pedir a volta da genialidade dos nossos artistas, mas diante das bestrofes e futilindezas que dominam o carnaval já estaríamos no lucro se retornasse um ritmo que embalou os anos 80 e que, se comparado aos "sucessos" de hoje, dos males é o menor: a lambada. 


Torço para que ela volte adocicando nossos ouvidos, nem que seja reencarnada no corpo de um comercial de cerveja.


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