A Besta segue
ensimesmada. Em si, empesteada. “Deixe de bestagem!”, todos diziam, mas
ela não deixou. A Besta ou a Fera, como era chamada, já foi uma pessoa comum.
Nasceu de pai e mãe, teve irmão, periquito e cachorro. Por mais que tentasse o amor,
aos poucos foi sentindo as dores do mundo e delas vieram cicatrizes. Cortes feriram
a carne, dilaceraram sua face, sangraram o coração. De tanto apanhar de todos o
tempo todo adquiriu essa imagem horrenda. Quanto mais assustadora ficava, mais
apanhava e mais assustadora ficava. Num extinto animal de sobrevivência provou
que de besta não tinha nada. Se isolou no alto de uma torre. Trancafiado na
masmorra ou vagando furtivo pela floresta, hoje a Besta vive sem o contato com as
pessoas, tendo como única companheira a memória de quando era uma pessoa feliz.
E com essa lembrança, prometeu a si mesma retomar o contato com a civilização quando
souber que ninguém mais a fará de besta.
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